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Nesse início de 2015 temos sentido em maior ou menor escala falta de água e energia e somos assim forçados a aprender a lidar com novas realidades, onde as torneiras e interruptores insistem em não atender nossas expectativas.

Encontros com amigos e familiares derivam naturalmente para discussões acaloradas, onde modelos equivocados e gestores incompetentes são responsabilizados e condenados, sem chance de defesa.

Nossa confiança é colocada em cheque, quando aspectos triviais do dia a dia simplesmente não acontecem como esperado.  Todos os dias acordamos confiando no despertador, chuveiro, cafeteira e nos diversos meios de transporte que nos levam ao trabalho ou escola. Aprendemos desde muito pequenos a confiar no funcionamento destas coisas que nos são apresentadas por pais, irmãos, professores, amigos, e namoradas.

Além disso, em nosso processo de desenvolvimento pessoal, adquirimos experiências que nos fazem apoiar ou resistir a diferentes ideias como uma economia calcada nas leis de mercado ou em planejamento e controle centralizado, ou em uma carreira profissional turbinada por Empreendedorismo, com altos riscos versus Serviço Público e Segurança.  Confiamos mais em quem defenda nossos pontos de vista e desconfiamos de quem vai na “contramão”.

Entretanto, tanto as coisas, como as ideias são criadas e desenvolvidas por pessoas, que carregam suas capacidades e intenções.  Somente o tempo e o aprofundamento das relações nos permitirão confirmar nossas expectativas e desenvolver relações de verdadeira confiança, que talvez seja o que verdadeiramente nos faz mais falta nestes dias quentes de verão.  Em nosso país passamos por uma profunda crise de confiança nos políticos, partidos, juízes, policiais, ídolos e gestores.  Na verdade, com raras exceções, não confiamos em ninguém.  Mas, nem sempre foi assim.

Quando bebês, iniciamos nossa vida em um ninho de amor, calor e acolhimento, fundamental para o desenvolvimento dos sentimentos básicos de confiança nas pessoas e no mundo, que nesta fase da vida, é muito bom.  Nossos primeiros sete anos em família influenciam decisivamente nossos relacionamentos ao longo da vida. Na sequência, mergulhamos cada vez mais no mundo através da escola, turmas de amigos, universidade e trabalho, acumulando experiências, onde oscilamos entre a desconfiança e a confiança cega, dois extremos que não nos servem, mais que balizam todos os relacionamentos que construímos.

Criar relações de confiança nos oferece um mundo de possibilidades e realizações, mas nos pede coragem, compreensão, boa escuta, capacidade de dialogar e vontade de construir algo juntos.  Por outros lado, uma vida sem confiança seria praticamente impossível, além de extremamente cansativa e frustrante.

Isso não equivale dizer que devemos baixar completamente nossas “defesas” e acreditar cegamente que não existem perigos escondidos, mas que podemos confiar desconfiando um pouco e desconfiar, acreditando que pode existir algo positivo ainda não percebido.

Como no caso de água e energia, não temos como evitar as diversas faltas que virão pela vida, mas podemos escolher aprender com todas as situações, o que só depende de nós mesmos e não podemos deixar que falte.

Neste sentido, aproveito pra recomendar a leitura do livro “Confiança, Doação, Gratidão: forças construtivas da vida social.” de Lex Bos, que me inspirou algumas das ideias deste artigo.