. A dimensão existencial (ou espiritual), que, como diz o nome, diz respeito às perguntas que apenas os seres humanos, dentre todos os seres vivos da Terra, fazem sobre sua própria existência. Esta autorreflexão, seja como indivíduo ou espécie, busca a compreensão de nossa origem tanto quanto procura sentido ao mirar o futuro. Não tratamos aqui de religião, ainda que falemos, sim, do que é sutil. Esta dimensão é íntima, viva e pulsante em nosso mundo interior, e tem a ver com visão de destino, relacionada ao legado que cada um de nós imaginamos deixar, como nossa contribuição única para o mundo a partir da nossa “passagem por aqui”. Não se trata de uma imagem estática e nem tampouco nítida, necessariamente. Ao contrário, pode ser difusa, quase como uma intuição ou um chamado na neblina, e muda durante nossas vidas, da mesma forma que mudamos nós. Pessoas que têm mais sentido de propósito e consciência de seus valores tendem a ser mais resilientes e saudáveis, enquanto aquelas que “se perdem” dos mesmos tendem a sofrer emocionalmente e, em última instância, até mesmo adoecer (impacto fisiológico e físico). Na liderança, falar a partir de seus valores e conectar-se a uma causa genuína e comunicá-la com frequência e clareza são das habilidades mais especiais, que “faz a diferença” para qualquer equipe ou organização – e trabalhar junto a um líder que faz isto bem é uma experiência inesquecível, já que permite a cada colaborador compreender o significado maior de suas tarefas cotidianas e, assim, sentir-se realmente identificado.
. A dimensão relacional, interpessoal, diz respeito a nossa vida como entes sociais e é fortemente transpassada pelo afeto e emoção. Vivemos em comunidade e nos definimos nas relações. Desde que nascemos precisamos dos outros não simplesmente para subsistir, mas para existir ou “ser” como alguém que faz parte e que, de uma ou de outra forma, é (re)conhecido. É na relação com um Outro (mãe, pai ou cuidadores, avós, professores, colegas e depois companheiros, filhos, colaboradores ou líderes etc.) que constituímo-nos como “sujeitos” . Ninguém é alguém sem outrem. A maior penalidade em qualquer sociedade, pior que a morte ou o cárcere, é a simples exclusão, o exílio: isto por que, em nossa experiência humana, deixar de pertencer beira o deixar de ser. Na liderança, como na vida, atuamos em um mundo social, representado por uma constelação de interfaces (ou stakeholders) internas e externas à organização: acionistas, membros do conselho, governo, sociedade, clientes, fornecedores, colaboradores, pares, subordinados… Na consecução da tarefa de transformar nossos propósitos pessoais ou organizacionais em realidade concreta, gerenciar nossa relação com todas estas interfaces é indispensável. Salientamos aqui, porém, o cuidado com a equipe como uma das maiores fontes de realização, já que ela, de um lado, é a tripulação que conduzirá a nave na jornada rumo ao destino desejado, tendo impacto no sucesso ou insucesso de empreitada… Mas também, de outro lado e talvez de forma ainda mais significativa, por que servir a outros indivíduos ou grupos, apoiando-os em seu desenvolvimento e desempenho, pode ser uma das maiores fontes de alegria e satisfação existencial para um líder, que confere um verdadeiro sentido de legado.
. A dimensão material e produtiva, a mais perceptível aos sentidos, bem representada por nossa força física, que empreende e produz o novo no mundo. Falamos aqui de uma capacidade de nos expressarmos através de uma produção tangível para o meio e para a sociedade, na qual efetivamente produzimos algo que agrega valor e que pode ser aplicado de forma concreta ou abstrata, utilitária ou artística — ou ainda simbólica. Trata-se da força de realização que se manifesta desde que o homem aprendeu a transformar a natureza, esculpindo suas primeiras armas, fazendo ferramentas, moldando utensílios, arando ou forjando, trocando, criando arte, projetando e produzindo artefatos ou mesmo serviços (“servindo”). Na liderança, esta talvez seja a dimensão da qual mais somos lembrados, nas organizações: “estamos aqui para entregar resultado”. Porém, aqueles líderes que atuam isoladamente nesta dimensão, são constantemente percebidos como “tratores” ou “sargentos”, para quem tudo vale por uma entrega. Ninguém pode negar que a realização concreta no mundo é altamente gratificante, “realizadora”, para qualquer pessoa ou membro de equipe. Mas apenas focar entregas, sem vínculo a um “para que” e “como”, não alcança sustentação saudável no longo-prazo.
Podemos nos perguntar, agora: na liderança, estas três aparentes dimensões de realização são experimentadas, na vida prática, de forma estanque? Nossa compreensão é que são tão intimamente ligadas que são quase inseparáveis, como se fossem apenas uma.
Como seria, então, este continuum na liderança? O líder que se auto realiza o faz mais integralmente quando está “escutando” e atendendo ao plano mais elevado de sua existência; um maior sentimento de auto realização favorece o estado anímico, emocional, o que por sua vez favorece os relacionamentos; o líder que quer transformar propósitos em realidade tangível, por outro lado, o faz com mais assertividade quando engaja pessoas na causa, e aqueles que já se viram “a serviço” de outros sabem o quanto o espírito é alimentado neste “servir” – à causa e também a uma equipe; líderes e equipes unidos, com causa e valores claros e confiança nas relações são, em seguida, mais eficazes em entregar resultado de forma sustentável, a longo-prazo… E entregar resultados em um ambiente de saúde nos relacionamentos alimenta o sentido de auto realização, movendo o ciclo em sentido virtuoso…
Daí, enfim, a simbologia da fita de Moebius: ela representa um caminho sem início nem fim, infinito, onde se pode percorrer toda uma superfície que aparenta ter dois lados, mas só tem um – e onde “dentro” e “fora” é, verdadeiramente, uma única coisa.
Bem vindo à Liderança Realizadora!
[1] Fonte: Wikipedia.org