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Nesta Páscoa, tive uma experiência diferente.

Na quinta-feira, decidi aproveitar algum tempo livre pela manhã para enviar e-mails a pessoas com quem conversei ou convivi no último ano. Minha mensagem expressava o desejo de que a Páscoa pudesse representar o início do caminho de renascimento do qual nossa sociedade tanto precisa.

Qual não foi o meu espanto quando diversos amigos, clientes e colegas responderam às mensagens falando da grande surpresa de receber uma mensagem na Páscoa, sobre o quanto isto seria pouco usual (por exemplo, se comparado às festas de fim de ano), e expressando um alegre carinho e gratidão.

A surpresa surpreendeu-me! Refleti: verdade que não tinha o hábito de falar desta ocasião com meu círculo profissional. Por que fiz isto este ano? O que mudou em mim? Teria sido eu inadequada? O par de horas que sobraram em meu dia teria sido motivo suficiente para me fazer atuar diferente este ano, fazendo algo tão “estranho a mim mesma” que as pessoas fizeram questão de assinalar?

Então, lembrei disto…

E disto…

E destas imagens…

Descobri: sim, algo sutil mudou em mim mesma no ano passado, quando passei a Semana Santa na Alemanha. Logo na chegada, numa caminhada na pequena cidade de Frickenhousen am Main, onde decidimos pernoitar,  fiquei encantada com a decoração de Páscoa. A cada novo cantinho, numa janela, arbusto, fonte ou ao virar uma esquina, encontrava graciosas decorações com ovos pintados, fitas, coelhinhos ou ainda ovos de pedra, numa delicadeza sem fim. Por trás daquelas imagens, podia imaginar o processo de criá-las, talvez com avós, pais e suas crianças dedicas à escolha dos objetos, à pintura, a sua organização de forma tão estética e cuidadosa naquele espaço escolhido. O caráter artesanal falava alto, contrastando com nossa Páscoa industrializada de ovos enrolados em papel brilhante, pendurados com ganchos plásticos no alto das gôndolas dos supermercados. Não, pelo contrário: os ovos e decorações me remetiam a momentos acolhedores, íntimos, divertidos. Aquilo me tocou mais do que eu mesma pude imaginar… Suspeito, agora, por que: por que foi feito por gente reunida amorosamente em torno de um ritual e seus símbolos. Cada ovo era um gesto. Eram ovos com aura — como arte original tem aura, também!

Aquelas pessoas que nem conheci me tocaram. Tocada (ou seja, um pouquinho transformada), eu pude atuar diferente e tocar a outros também, no ano seguinte. Pude, de alguma forma, e ainda que com menos cores, transmitir o gesto que recebi, de um jeito absolutamente insuspeito. Daí o título deste texto: “só aquilo que me toca pode tocar o outro através de mim…” Mas o que isto tem a ver com os temas que tratamos aqui neste website?

Ao liderar, ao trabalhar com identidade e cultura, ao buscar mobilizar pessoas rumo a um norte comum, lidamos constantemente com o campo dos rituais e significados. Fico com a reflexão, que deixo para você, também: no que tange a lidar com as dimensões sutis dos homens e mulheres, dos grupos e das organizações, precisamos buscar fazer com alma, o que torna nosso ofício muito mais artesanato amoroso do que técnica calculada e massiva. Estamos no ofício de tocar. Só tocar pode realmente transformar. Um brinde de Páscoa ao gesto que toca, portanto!