Minha filha concluiu o Ensino Médio no ano passado. Foi mais um ano difícil e que terminou com uma cerimônia na própria escola que me trouxe muitas emoções e reflexões. Chorei quase todo o tempo, feliz e grata por ela ter conseguido. É minha segunda borboleta que prepara seu voo. Ainda em fase de casulo, mas em transformação.

Na cerimônia, cujo enredo foi construído colaborativamente por toda a turma, eles se apresentaram com arte, música, dança, poesia e circo. Naquele palco improvisado, o momento mais icônico para mim foi quando eles destruíram blocos de argila no chão enquanto gritavam “chega, chega, chega”. Eu fiquei impactada com a ação e pensando “o que este grito significa?”. O que é este “chega” tão desejado, ansiado, necessário? Só entendi próximo ao final, pois se tratava de um clamor para todos nós: chega desta sociedade doente que tira a esperança na vida. Minha filha gritou em alto e em bom tom e várias vezes: chega!

Em um mundo de só fazer, de só ganhar, de só valorizar o aparente e a aparência, é fácil se perder de si. Chega!

Em um mundo que ainda valoriza o controle, a manipulação e o poder, é fácil se perder do outro. Chega!

Em um mundo de consumo, materialismo e consequente visão de curto prazo, onde só eu tenho razão e direitos, é fácil perder (ou matar) a oportunidade de viver. Chega!

Há espaço para todos e ainda nos vejo jogando os jogos onde só resta um… Chega!

O grito daquelas crianças deveria reverberar por cada casa, cada esquina, cada corredor de empresas. Há formas melhores de se relacionar, de gerir equipes e organizações, de olhar para o ser humano ao seu lado. Eu não tenho respostas, mas minha alma se alimenta dos bons exemplos que existem, das provocações que muitos têm feito para romper com um olhar de passado para pensar futuro. E minha alma se alimenta do entusiasmo destes jovens que sonham com este mundo melhor, mesmo que ainda na fase de casulo. Se posso emprestar da meditação que usamos nas reuniões da Lumo, aí vai: “Seres humanos, queiram ouvi-los”.

01 de fevereiro de 2022, 
Por Silvia H. Magalhães.