Lembro de um ditado popular que dizia: “O pior cego é aquele que não quer ver”. Sim, de fato. Mas, e se mais do que não querer ver, alguém não consegue ver? Na forma e no ritmo que temos levado a vida, qual a possibilidade de alguém enxergar verdadeiramente?

Acredito que, para enxergar, temos que ter um genuíno interesse pelo outro e isso pede tempo, calma e presença. Temos que calar as diversas vozes internas que nos preenchem e não deixam o outro entrar. E como isso é difícil, pois julgamos a todo momento, pré-assumimos posições e já definimos o desfecho de uma questão. Somos tão autocentrados que não conseguimos ver fora de nós.

Conversando com os participantes da Formação Lumo sobre conflitos, falamos sobre o quanto é difícil dar o primeiro passo na direção de encaminhar um conflito que, na verdade, é um passo na direção do outro. É difícil não apenas pelo nosso próprio receio de se enfrentar, mas porque o ambiente ao redor não incentiva e, inclusive, qualifica este movimento como fraqueza. Vencer é brigar, é não recuar, é ficar por cima… quem dá o primeiro passo parece que é o perdedor e não aquele que conseguiu enxergar. Da mesma forma que, em nossa sociedade, o altruísta vira o otário. Assim, há sempre algo entre você e eu… algo que eu crio, que eu possuo, que me foi imposto e que eu imponho no outro, impedindo-me de enxergá-lo.

Somos incentivados a este distanciamento. Somos conduzidos a uma valorização desta aparente vitória e deste bem-estar, quando a verdadeira coragem é criar a possibilidade do encontro e só a vontade e a busca ativa pelo autodesenvolvimento podem ajudar.

Como foi com João Batista na chegada do Cristo, temos que nos diminuir para o outro poder crescer.

Damos muito pouco a quem se dirige a nós, recebemos muito pouco e não realizamos o encontro. E, talvez, citando Goethe, “é verdade, sou apenas um viajante, um peregrino sobre a terra! Será você algo mais do que isso?”.

 

12 de outubro de 2021, 

Por Silvia H. Magalhães.